Ainda em tempos ludovicenses (qualidade de quem é de São Luís), cultivamos outras histórias que (a)o sul não parece tanto importar...além do reggae, o tambor de crioula - batuque dos primórdios -, o tambor de minas - religião propriamente desenvolvida pelos negros e negras dessa cidade -, a invasão francesa e a expulsão por Jerônimo de Albuquerque, que hoje é nome de umas das principais ruas de S. Luís. E outros contos que constituíram a bela cidade nordestino-amazônica...
20 DE JANEIRO
"Venha provar meu crunch, saiba que eu tenho o approach, na hora do rush, eu ando de ferry boat"
Despedidos da cidade, rumamos ao porto para tomar o ferry boat, resultado da combinação sambística interpretada por Zeca Baleiro, um dos artistas maranhenses mais expressivos no Brasil, mas que, como muitos, migrou para o eixo comercial Rio-Sampa...
Invadimos a Amazônia como ela nos quer: deslizando por 3 horas pelos rios que nos deixam em Cojupi, de onde partimos pedalando...
No porto de Cojupi: 30 carangueijos amarrados em um cesto...levamos na bicicleta...
De cara, a Comunidade Quilombola Maurício, percebida tanto pela placa que ali a nomeava quanto pela aparência e aparição de muitos negros em suas casas de palha (a população negra não é tão comum nos trechos nordestinos pelos quais passamos, exceto S. Luís)...
Em seguida, as subidas e descidas: Maranhão nos fez suar mais nesse sentido...
fim de tarde: chegada em Pinheiro, cidade da família Sarney, hegemônica no estado...aliás, tão dominante que coloca nomes do familiares, ainda vivos, nas obras públicas (desde S. Luís, víamos essa arrogância), sem a mínima consulta pública...chegando, avistamos a chuva na cidade e muitos búfalos nos pastos, margeando a estrada...
Lá, ficamos na casa de Dona Silvia, tia de Nelma, aquela colega de S. Luís...senhora gente finíssima, pegou nos carangueijos e os fez na panelona...um deles ainda havia fugido da pia da cozinha, mas à noite capturado no quintal...então, Daniel e Cadu conheceram a delícia e o trabalho que há em comer os carangas... Rodrigo e Roberta já conheciam a história...
Lavadas as roupas, não secaram a tempo...o que fazer? Ora, um "ciclovaral"!!! Daniel pendurou seus trapos num varal improvisado sob apoio de Dona Silvia...
Pinheiro é a maior cidade da região, pólo que depende de outros pólos, como Fortaleza e S. Luís... a maior parte dos trabalhos se dá no comércio e no serviço público...
21 DE JANEIRO
Rumo a Maracaçumé...trajetória um pouco conturbada,mas sem problemas...chegamos no final da tarde...Elias, filho de Seu Chicó (pai de Nelma) veio nos receber de bicicleta também, num posto na entrada da cidade...desde então, notamos a simplicidade da família que nos acolheu...recém-mudados para a casa, a família de Chicó se mobilizou toda para nos ajudar a instalar as bicicletas dentro da casa que ainda contava com banheiro a céu aberto (na chuva,Roberta tomou banho e tentava se secar, mas não adiantava) entre outros improvisos...Evangélico, Chicó fez a prece de recepção e de despedida, dia seguinte, que nos comoveu e nos fortaleceu, simplesmente por vermos neles o desejo em nos querer muito bem na viagem...dormimos ao som de um pastor que, na igreja vizinha à casa, orava com voz estremamente alta...a vizinhança inteira ouvia...
Maracaçumé é cidade com características bastante rurais...desenvolvida nas margens da Br que conduzia ao Pará, logo adiante...rural e pobre...muitos trabalham na cultura do Açaí, que no Pará se torna ainda mais forte... dois filhos de Chicó buscam a fruta na plantação e carregam cerca de 100 quilos no bagageiro da bicicleta (nossa bagagem não dá nem pro cheiro, se comparada com a deles)...a bicicleta, aí, entra como transporte de carga diário... as perspectivas no Açaí ainda parecem grandes, como a cultura atual de cultivo, geração de renda e emprego...muitos acreditam no poder econômico dessa fruta, que serve no almoço (com carne, farinha etc), no lanche da tarde (com açúcar e tapioca), na janta... Açaí!
22 DE JANEIRO
De Maracaçumé a Cachoeira do Piriá
5h45 da manha, pé na estrada. Despedida de mais uma família que nos acolheu. A meta: Santa Luzia do Pará, 135km adiante.
No inicio tudo parecia correr bem, foi quando o primeiro pneu furou, tiramos meia hora para os reparos. O pneu com pouca pressão deixava a bicicleta ainda mais pesada e o ritmo do grupo diminuiu.
Apesar disso, a parada já tradicional para chupar manga do pé na beira da estrada não foi abortada.
O pneu continuou esvaziando, o tempo até o destino final já estava ficando escasso. Trinta quilometros depois avistamos um posto. Pneus calibrados, estomago cheio a um quilometro da divisa entre Maranhão e Pará. Pneu vazio de novo. A ciesta dos maranhenses havia acabado de começar e a bicicletaria estava fechada.
Fazer o que?
Fomos até o Gurupi tomar um banho de rio onde encontramos um grupo de jovens voltando de um encontro de Centros Acadêmicos. Mas afinal: Quem é o Cabelo???
Bicicleta arrumada era hora de partir. Já eram três da tarde...a dúvida é se teríamos que mudar os planos.
Alguns quilômetros depois o problema foi resolvido. Mais um pneu furado, ou melhor, neste caso, estourado. Destino final: Cachoeira do Piriá.
Primeira tentativa para conseguir abrigo foi a prefeitura. Já era tarde, o prefeito não estava, nós e algumas crianças que curiosas nos receberam na cidade fomos até a casa dele, do filho dele, do Secretario de Cultura (sim, na ausência do prefeito, recomendaram falar com o filho, e não com o vice...)...até que achamos alguém e conseguimos abrigo em uma escola com direito a uma canjinha do ensaio de uma dança típica de um grupo da cidade para o carnaval.
Dia cansativo...
Janta, cama e muitas muriçocas....
23 DE JANEIRO
De Cachoeira do Piriá a Capanema
A mudança de planos não poderia ter sido melhor. Os primeiros 50 quilômetros tinham muitas subidas e descidas. Uma queda atrapalhada na frente da única pessoa parada na estrada nos rendeu o dia. Dona Irene se desesperou: Minha filha! Você caiu e ficou aí pererecando! Eu te salvei! Quando vocês passarem por Santa Luzia do Pará, passem na minha casa.
Não precisou, Dona Irene nos aguardava na estrada. Já tinha até tirado os bifes pro almoço e nós sem saber e ansiosos pelo açaí, compramos a fruta batida. Sem problemas fomos até a casa dela e comemos tudo: açaí com farinha d´água e charque e açaí com banana e granola. A alegria e a simpatia de Irene eram cada vez maiores. Duas horas depois a preguiça e a vontade de ficar mais um pouquinho por ali conversando eram enormes, mas ainda estávamos na metade do caminho e teríamos que ir até Capanema.
No caminho conhecemos um ciclista que parou para conversar. Laércio, nos avisou sobre uma trilha que um grupo faria no domingo em Belém e sobre uma bicicletada no dia 30. Na primeira não conseguiremos chegar a tempo, mas na bicicletada a presença está confirmada.
Na chegada a Capanema, dormimos em um dormitório no Posto Garoupa, na beira da BR316.
Mais uma decisão a ser tomada, faltavam 150 quilômetros pra chegar em Belém, dias de folga, vamos pra praia? Ilha do Marajó, Algodoal ou Salinópolis? Pesamos os prós e os contras e dia seguinte tentaríamos ir pra Salinópolis para a travessia de barco para Algodoal para conhecer os dois...será?
24 DE JANEIRO
De Capanema a Salinópolis
A saída da cidade foi um tanto confusa: uma dupla para um lado, roupas caindo da bicicleta e outra dupla para outro lado.
Demorou mas nos achamos. Alongamos e seguimos.
Chegamos em Salinópolis - na verdade Salinas, nome que todos chamam a cidade que teve uma primeira usina de produção de sal na região norte brasileira - por volta das 15 horas, sobre uma chuva intensa, depois de termos enfrentado várias subidas e decidas.
Resolvemos parar em um posto de combiustível para nos informamos a respeito de um local barato para matarmos a fome que nos matava. Assim, fomos em um restaurante que nos indicaram e, de cara, percebemos que era coisa fina. Nos demos mal....a conta saiu cara pra caramba....o rango mais caro da viagem e também o pior atedimento que tivemos.
Ainda molhados, Rodroigo e CadU dirigiram-se até o Porto Grande, local onde se concentam os pescadores e se dá todo o comércio de peixe, para tentar um barco que nos levasse até Algodoal; Daniel e Roberta foram até a rodoviária encontrar Fernanda (Amiga de trabalho que iria ao FSM), que estaria na cidade por volta das 17 horas
Lá chegando, inciaram um papo com os pescadores que ali estavam, e conheceram Penha, que disse que nos levaria até Algodoal e ainda ofereceria um local para passarmos a noite juntamente com uma caldeirada de peixe. Aceitamos de pronto.
Ao anoitecer chegaram os três, tomamos umas cervejinhas no bar dos pescadores e rumamos para onde posariamos à noite.
25 DE JANEIRO
Cedo, bem cedo, no horário de sempre, rumamos todos em direção a praia de Algodoal para curtir um domingão de sol e chuva. Um dia de praia, afinal.
26 DE JANEIRO
Às 06:00 horas dessa segunda-feira, fizemos a travessia náutica em direção a Marudá. Fernanda ficou em Algodoal para corar mais um pouquinho.
De Marudá, fizemos 90 Km até Castanhal, cidade de onde agora escrevemos.
A estrada é muito boa, sem grandes subidas, quase todo o trajeto no plano, porém sem acostamento, dificultando e muito a vida do ciclista que tem de dobrar a atenção. Assim que chegamos nos dirigimos até a prefeitura para tratar de conseguir um abrigo. Eram aproximadamente 14:30 o horário que chegamos em Castanhal e, para nossa surpresa, o expediente já havia se encerrrado. Todos os orgãos públicos funcionam até ás 13 horas por aqui. Para quem se interessar, a cidade está com concurso aberto para vários cargos.
Falaram-nos para irmos na igreja conversar com o padre para nos abrigar durante essa noite. Lá tivemos a informação de que estava viajando e que so retornaria na próxima semana, e que ninguém, fora ele, poderia nos ajudar.
Tivemos então a informação sobre a Secretaria Municipal de Assistência Social - SEMAS, que possivelmente nos ajudaria. Para lá fomos. O expediente, claro, já havia se encerrado, mas por obra do destino encontramos Solange, uma funcionária que participa do comitê de apoio ao FSM criado em Castanhal. Ela muito getilmente contactou Amiraldo, Assistente Social, que prontamente se disponibiliozou a nos hospedar na noite de hoje. Chegamos em seu condominio e logo já fomos fazendo amizades com seus vizinhos, que ficaram encantados e ajudaram a preparam um jantar delicioso.
Daqui, restam 70 km para chegarmos em Belém, que começaremos a percorrer amanhã cedinho, como sempre foi até aqui.
Castanhal é, mais ou menos, a quinta mais populosa cidade do Pará. Formou-se a partir da migração de gado, com seus donos, de S. Luís a Belém...a vila foi crescendo com os descansos infindáveis dos donos do gado...Hoje, ainda com árvores de castanhas, a cidade conta com 77 anos anos...
Pedimos desculpas a todos pela demora na postagem mas tem sido muito difícil encontrar uma maneira de escrever. E agora que encontramos estamos cansados.
As fotografias estamos devendo: problemas tecnológicos entre as máquinas e as lan houses que encontramos... logo, seguirão...e nós, amanhã, para outra jornada...
Em Belém!!!
Cadu, Roberta, Daniel e Rodrigo.